domingo, 13 de setembro de 2015

Setembro cinza novamente no Acre

Imagem ilustrativa 

Ecio Rodrigues

Entre 2005 e 2010, por meio da publicação de uma série de artigos, este articulista passou a divulgar uma campanha, intitulada “Para o Acre não queimar em 2010”, com o propósito de discutir (e promover) o fim da prática da queimada como elemento essencial do sistema de produção rural levado a efeito no Acre.

Alertando quanto aos efeitos perversos das queimadas para o meio ambiente e para a saúde pública, os artigos refutavam dois dos apelos mais comuns levantados pelos defensores da nefasta prática: “tradição agrícola” e “fome”.
O primeiro argumento – bastante exasperador, por sinal – arvora uma “cultura de produção agrícola”, segundo a qual o produtor, depois de desmatar o roçado, realizaria a queimada por conta duma tradição repassada por gerações ancestrais.

Até existem registros indicando que algumas etnias indígenas ensinaram os colonizadores portugueses a cultivar o solo amazônico com o emprego da queimada. Mas daí a se traduzir em uma cultura indelével, impossível de ser abandonada, a distância é muito grande.

Por outro lado, diante da crise ecológica planetária causada pelo aquecimento e consequentes mudanças climáticas, em cujas ocorrências, por sua vez, a perigosa contribuição das queimadas na Amazônia está fartamente comprovada pela ciência, não se questiona que pseudotradições ou eventuais heranças culturais devem ser revistas.

Embora sem qualquer base técnica ou científica, o apelo da fome é ainda mais pernicioso, por arrastar uma massa de desavisados que gosta de defender o pão que vai à boca dos menos favorecidos. Esse argumento, contudo, encerra pelo menos um grave equívoco, pois desvaloriza o produtor rural (ou agricultor familiar, como prefere a maioria), diminuindo o seu trabalho e considerando sua propriedade incapaz de fornecer-lhe o próprio sustento. Equipara o produtor aos mendigos e esfomeados que transitam nas áreas urbanas, o que definitivamente não tem o menor cabimento.

Todo produtor sabe que o cultivo de uma área inferior a um hectare com maniva é suficiente para fornecer alimento para toda a família, por mais de cinco anos de maneira ininterrupta e sem queimadas. Igualmente, todo produtor também sabe que a forma mais rápida e barata para limpar um novo roçado ou ampliar o antigo é a queimada. Agora, se a sociedade urbana e um Estado ineficiente só aceitam a queimada sob o pretexto da fome, certamente esse pretexto será dado.

A campanha previa um prazo de cinco anos para que o Estado se planejasse, de forma a zerar as queimadas até 2010. Passados 10 anos desde o seu início, todavia, os dados demostram o fracasso da empreitada. Em 2010, o Acre queimou mais que nos últimos 15 anos – à exceção do recorde ocorrido em 2005, quando aconteceram 4.746 focos de queimadas, além do incêndio florestal que destruiu mais de 200 mil hectares de florestas em Brasiléia.

Desde o ano de 1998, quando o Ministério da Ciência e Tecnologia iniciou as medições no Acre, a média registrada no mês de agosto fica em 634 focos de queimadas. Para se ter uma ideia, em agosto de 2015 (até o dia 27), ocorreram no Acre 1.254 queimadas. E a tendência é de elevação: haja vista que 1.912 queimadas foram detectadas em 2011, e que em 2014 os satélites fotografaram 3.829 focos, a expectativa para 2015 são pouco animadoras.

Um novo recorde de queimadas no Acre pode estar por vir.

Da mesma forma que se constata em relação ao aumento do desmatamento, a quantidade elevada de queimadas parece refletir um novo ciclo produtivo no Acre – no qual a floresta não passa de mero empecilho.


Nenhum comentário:

Postar um comentário