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Imagem ilustrativa |
Ecio Rodrigues
Entre 2005 e 2010, por
meio da publicação de uma série de artigos, este articulista passou a divulgar
uma campanha, intitulada “Para o Acre não queimar em 2010”, com o propósito de
discutir (e promover) o fim da prática da queimada como elemento essencial do
sistema de produção rural levado a efeito no Acre.
Alertando quanto aos
efeitos perversos das queimadas para o meio ambiente e para a saúde pública, os
artigos refutavam dois dos apelos mais comuns levantados pelos defensores da
nefasta prática: “tradição agrícola” e “fome”.
O primeiro argumento –
bastante exasperador, por sinal – arvora uma “cultura de produção agrícola”,
segundo a qual o produtor, depois de desmatar o roçado, realizaria a queimada
por conta duma tradição repassada por gerações ancestrais.
Até existem registros
indicando que algumas etnias indígenas ensinaram os colonizadores portugueses a
cultivar o solo amazônico com o emprego da queimada. Mas daí a se traduzir em
uma cultura indelével, impossível de ser abandonada, a distância é muito
grande.
Por outro lado, diante da
crise ecológica planetária causada pelo aquecimento e consequentes mudanças
climáticas, em cujas ocorrências, por sua vez, a perigosa contribuição das
queimadas na Amazônia está fartamente comprovada pela ciência, não se questiona
que pseudotradições ou eventuais heranças culturais devem ser revistas.
Embora sem qualquer base
técnica ou científica, o apelo da fome é ainda mais pernicioso, por arrastar
uma massa de desavisados que gosta de defender o pão que vai à boca dos menos
favorecidos. Esse argumento, contudo,
encerra pelo menos um grave equívoco, pois desvaloriza o produtor rural (ou
agricultor familiar, como prefere a maioria), diminuindo o seu trabalho e
considerando sua propriedade incapaz de fornecer-lhe o próprio sustento.
Equipara o produtor aos mendigos e esfomeados que transitam nas áreas urbanas,
o que definitivamente não tem o menor cabimento.
Todo produtor sabe que o
cultivo de uma área inferior a um hectare com maniva é suficiente para fornecer
alimento para toda a família, por mais de cinco anos de maneira ininterrupta e
sem queimadas. Igualmente, todo produtor
também sabe que a forma mais rápida e barata para limpar um novo roçado ou
ampliar o antigo é a queimada. Agora, se a sociedade urbana e um Estado
ineficiente só aceitam a queimada sob o pretexto da fome, certamente esse
pretexto será dado.
A campanha previa um prazo
de cinco anos para que o Estado se planejasse, de forma a zerar as queimadas
até 2010. Passados 10 anos desde o seu início, todavia, os dados demostram o
fracasso da empreitada. Em 2010, o Acre queimou
mais que nos últimos 15 anos – à exceção do recorde ocorrido em 2005, quando
aconteceram 4.746 focos de queimadas, além do incêndio florestal que destruiu
mais de 200 mil hectares de florestas em Brasiléia.
Desde o ano de 1998,
quando o Ministério da Ciência e Tecnologia iniciou as medições no Acre, a
média registrada no mês de agosto fica em 634 focos de queimadas. Para se ter
uma ideia, em agosto de 2015 (até o dia 27), ocorreram no Acre 1.254 queimadas. E a tendência é de
elevação: haja vista que 1.912 queimadas foram detectadas em 2011, e que em
2014 os satélites fotografaram 3.829 focos, a expectativa para 2015 são pouco
animadoras.
Um novo recorde de
queimadas no Acre pode estar por vir.
Da mesma forma que se
constata em relação ao aumento do desmatamento, a quantidade elevada de
queimadas parece refletir um novo ciclo produtivo no Acre – no qual a floresta
não passa de mero empecilho.